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Vice do Corinthians diz que aceitar abertura da Copa foi erro

Perrone

19/03/2014 06h00

Em entrevista ao blog, Luís Paulo Rosenberg, vice-presidente do Corinthians e um dos principais idealizadores da arena corintiana, afirmou ter sido um erro aceitar fazer a abertura da Copa no futuro estádio do clube. Diz que o alvinegro só ficou com uma conta maior para pagar e não leva vantagem com o evento. Ele reclama de ter que bancar estruturas complementares e nega que  Lula tenha ajudado no projeto da casa própria alvinegra.

Além de explicar suas contas sobre pagamento e operação do estádio, ele faz elogios à nova arena palmeirense e prevê que o Morumbi não irá conseguir fazer grandes shows por causa da concorrência.

Confira abaixo a entrevista, concedida na tarde da última segunda, por telefone, antes de Michel Platini, membro do Comitê Executivo da Fifa e presidente da Uefa, admitir que o estádio corintiano é a principal preocupação para a Copa do Mundo no momento.

Pelas suas contas, quantos anos o clube levará para pagar o estádio e quanto vai pagar anualmente? Andrés Sanchez diz que paga em até seis anos, segundo o Blog do Juca Kfouri. Você concorda?

Qual o cabimento dessa pergunta?  Eu vou pagar o estádio em 12 anos, não tenho que pagar em seis. Então cria um falso debate. Tenho um financiamento para pagar em 12 anos e cabe dentro do orçamento. O que o Andrés quis mostrar é que se o estádio custa R$ 800 milhões e tem uma geração de R$ 120 milhões, R$ 130 milhões por ano, em seis anos ele paga. Não é isso que vai acontecer. Nós vamos pagar nos mesmos 12 anos. Naquela conta [feita por Andrés e apresentada no Blog do Juca Kfouri]  não tem custo financeiro, não está completa com o valor de Cids [Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento]. Mas a tese que o Andrés quer provar é valida, é que quem falar que o Corinthians não tem condições de pagar o estádio é um demente. O estádio é extremamente viável e o endividamento é tolerável.

Mas para esclarecer o torcedor, qual o cálculo que você faz sobre o pagamento do estádio?

Não estou tão a par quanto estava enquanto eu pilotava esse projeto. Pelo que escuto, a gente deve ter uns R$ 110 milhões a mais de custo e uns R$ 60 milhões dessa despesa que a prefeitura iria fazer e está querendo repassar para o Corinthians [instalação das estruturas complementares]. Isso encareceria mais uns R$ 200 milhões. Esse estádio está sendo construído há quase três anos. Fazendo uma conta burra, digo simplista, supondo que esse desembolso foi sendo feito progressivamente, ele teria a gastar R$ 400 milhões. Tenho que pagar juros de três anos sobre esse montante.  Se eu tenho 10% de custo financeiro, três anos de juros de 10% sobre R$ 400 milhões, R$ 500 milhões, dá alguma coisa perto de R$ 150 milhões. Vamos trabalhar com um total de cerca de R$ 1,2 bilhão [valor total], contando já os R$ 60 milhões [das estruturas complementares]. A conta é muito fácil. Você tem que pagar R$ 100 milhões de amortização de R$ 1,2 bilhão, todo ano. No primeiro ano, devo R$ 1,2 bilhão. 10% de juros são 120 milhões, mais juros desse outro período que ficou remanescendo dá mais uns R$ 15 milhões por ano pelo período em que não paguei juros, os três anos.  Nos primeiros anos você vai pagando  alguma coisa perto de R$ 200 milhões de juros. No último ano você vai estar pagando R$ 100 milhões. Não é um número absurdo.  Nos cinco primeiros anos você já vai ter gastado perto de R$ 1 bilhão. Então, nos primeiros anos, o Andrés deve estar fazendo conta de receita de R$ 150 milhões por ano. Mas o cálculo dele é só bilheteria, sem naming rigths, comida, bebida, estacionamento, aluguel de espaço. Então você vai vendo que nos primeiros anos você está apertado e depois vai relaxando. Hoje nós temos uma receita de bilheteria que é por volta de 25 milhões, R$ 30 milhões. O que era uma premissa básica é que durante todo o período de pagamento do estádio, ele não pode entrar na receita de bilheteria que a gente teria no Pacaembu. Esse é o limiar entre um bom e um mau negócio. E se o Corinthians conseguir pagar o seu estádio sem jamais usar o dinheiro da bilheteria que ele teria jogando no Pacaembu, ele vai pagar o estádio simplesmente com a receita adicional que esse estádio vai gerar. Nesse sentido, acho sacanagem qualquer crítica no sentido de que o Corinthians não vai conseguir pagar o estádio ou vai ter que entregar o estádio. Como vai entregar o estádio se ele é feito para o Corinthians jogar lá? Agora, a respeito de receitas de shows, a gente entra numa área muito especulativa. Isso vai ter a ver com o desenvolvimento que a Zona Leste vai ter. Talvez, ele possa ser um grande polo de shows, de música sertaneja com ingresso mais barato e o Palmeiras fica com as Madonnas da vida. O que sei é que pro Tricolor vai ser difícil sobrar alguma coisa.

O São Paulo está fazendo uma arena nova para shows lá, está tentando fazer.

E por que não viabiliza? O cara que pega aquilo para estudar fala: "como que eu concorro com o Parque Antarctica"? É duro. O estádio do Palmeiras é muito privilegiado, acessibilidade fantástica, não tem que atravessar a ponte.

Mas o Andrés dizia que o estádio do Corinthians não teria shows.

Nosso projeto é esse mesmo. Acontece o seguinte, pra concluir pela viabilidade de Itaquera  nunca se colocou um tostão de previsão de receita com show. O Corinthians deve ser um dos únicos clubes do Brasil que consegue pagar uma arena dessas com receita de jogo. Não quer dizer que no futuro a gente não venha fazer. Se aquilo se revelar um polo atraente para shows, a gente pode fazer. Hoje existe tecnologia que permite fazer o show, não perder o jogo e ainda proteger o gramado. Mas por enquanto não é preocupação nossa.

Andrés vai aumentar o número de ingressos populares em relação ao projeto inicial. Isso pode prejudicar os planos do clube?

Isso mudou já. Não é que o prédio leste vai ter o mesmo preço de atrás dos gols. Ele criou dois blocos [no prédio leste], um a R$ 150 e a outra metade ele cobra acho que R$ 70. Isso pode ser administrável. Não é mais aquele cálculo de 16 mil lugares vendidos a R$ 30. Ele já está com preço médio perto de R$ 130, que já é mais do que no Pacaembu. Estou supondo que ele trabalha com preços efetivos, depois de descontos oferecidos para o sócio-torcedor.

[Nota do blog: em cálculo publicado pelo Blog do Juca Kfouri, levando em conta apenas a metade da capacidade de ocupação do estádio , mas com as arquibancadas provisórias, Andrés disse que venderá 10 mil ingressos por jogo a R$ 30 e 4.500 bilhetes a R$ 40]

Enquanto estiver pagando o estádio, o clube vai sofrer para fazer grandes contratações?

Enquanto se pensava em vender 16 mil ingressos populares era grave, agora não. Nesse cálculo aí a premissa está preservada. Considerando que o futebol sobreviveu 100 anos sem estádio. Se o Corinthians vai manter o crescimento de receitas que ele teria no Pacaembu, qualquer coisa a mais vai ser lucro e o time vai ser melhor do que era. O estádio, mesmo com esses custos, vai deixar um saldo bem bacana para o Corinthians. Tem outra coisa que o Andrés diz que vai explicar mais pra frente: é que além de ter o custo físico da obra, que é a conta que ele está fazendo, e você ter o custo financeiro do empréstimo, tem outras coisas que são as garantias. Quando você financia um estádio,  o banco  não aceita estádio como garantia. Então, você constrói uma garantia financeira. De cada real que pinga no caixa do clube você coloca uns centavos num fundo de liquidez. É um fundo que é 100% do Corinthians, mas fica retido para o caso de o Corinthians não conseguir pagar duas ou três prestações, pra ter de onde tirar o dinheiro.  Você constitui esse fundo, nuns três anos, ele fica rendendo juros pro Corinthians e se pagar tudo certinho ele volta pro Corinthians. Provavelmente vai dar pra comprar o filho do Kaká, mas no dia a dia é algo que também sai da disponibilidade do Corinthians.

Isso não estava no projeto inicial?

Não estava. Entramos nessa discussão para conseguir o financiamento do BNDES, que até hoje não saiu. É um fator da diminuição da disponibilidade que a gente teria do estádio. Não é empobrecimento do clube, porque o dinheiro é do clube, mas você não tem acesso ao dinheiro para comprar um jogador.

No plano inicial você já teria vendido os naming rights?

Sempre pensamos em coisa de R$ 400 milhões por 20 anos. O mercado tá muito ruim por causa da Copa. Essa é a principal razão para os naming rights não terem saído ainda. Entre o crescimento mais lento do Brasil e a Copa está havendo um deslocamento da disponibilidade de recursos para promoção muito grande. Mas isso passa, não acho que está muito longe desse valor, o que nós vamos conseguir no final da obra.

Mas não está demorando demais?

Tá dois anos atrasado.

Não é motivo para o torcedor se preocupar?

Não, porque de qualquer jeito estaríamos falando de R$ 30 milhões por ano. Falando de receita total prevista pra lá de R$ 230 milhões, de R$ 250 milhões. Então, é uma insuficiência de10%, 15%. É ruim? É ruim.  Não para estrutura do estádio mas por causa da dinheirama que a gente teria para comprar jogador.

Qual o cálculo mais atual de gasto com manutenção?

R$ 30 milhões anuais. De manutenção e operação.

Mesmo com esses R$ 30 milhões a situação é confortável?

Sim. O Andrés mostra R$ 150 milhões de receita, vamos pegar as outras todas [receitas], dá no total R$ 250 milhões. Tira R$ 30 milhões do custo de construção do estádio, dá R$ 220 milhões. No primeiro ano, se os juros forem altos, vamos gastar uns R$ 200 milhões. Já equilibrou com o Pacaembu. O pior ano vai ser o primeiro. Daí pra frente melhora. Então, até agora não está ameaçado.  Mas se a prefeitura não libera os Cids… Aí estamos falando de dinheiro grosso. Muito mais sério do que naming rights. Porque, apesar de os Cids serem de R$ 420 milhões e naming rights R$ 400 milhões, os Cids são cash. O combinado é entregou o estádio pra Fifa a prefeitura tem que colocar o dinheiro à nossa disposição. Isso abate um monte de juros que teriam que ser pagos, enquanto os naming rights se espalham por 20 anos. Começo a ver a prefeitura passar o custo da [estrutura de] hospitalidade para o Corinthians,  não vai querer fazer gracinha de querer passar também os [valores referentes aos]  Cids.

Mas o clube assinou documento se comprometendo a bancar as estruturas de hospitalidade.

Assinou esse ano, ano passado, não sei por qual motivo assinou. Não gosto dessa história.

Quanto isso atrapalha?

 Se eu tivesse que pagar R$ 60 milhões cash, o Corinthians não tem nem R$ 6 milhões pra pagar cash. Como é diluído em 12 anos, nada é suficientemente dramático para reverter a viabilidade do estádio. Agora, não é pra ficar todo mundo querendo entubar a gente. Se você lembrar bem, o primeiro sonho do Corinthians, que não deixaram realizar, era o Pacaembu. Se tivesse Pacaembu era muito menos despesa e melhor localização. Ok, não seria um estádio maravilhoso como esse. Nosso segundo plano era o nosso estadiozinho para 45 mil lugares, não passava em cima dos tubulões [dutos da Petrobras].  Esse estadiozinho tinha direito a 60% de Cids, sem precisar mexer na lei, sem ter que perguntar pra ninguém. Ele custava R$ 400 milhões. O Corinthians iria fazer um estádio de R$ 400 milhões, menos R$ 120 milhões [dos Cids]. O que tenho hoje é uma dívida de mais de R$ 1 bilhão, eu me meti com uma tal de Copa que não tenho nada a ver com ela… E ainda ficam me passando despesa de Copa.

Foi um erro entrar na Copa?

Sim, acho que não precisava disso aí, não. O Corinthians não tem vantagem nenhuma com Copa.

Mas tem direito a uma série de isenções graças à Copa.

Ele se qualificava como estádio de Copa, porque não serviria pra abertura, mas poderia fazer jogos menores. Então teria acesso ao financiamento [especial] do BNDES do mesmo jeito.

Então o erro foi aceitar a abertura, não a Copa?

Foi um erro aceitar a abertura. Continuo achando que abertura deveria ser no Morumbi. O Governador deveria ter dito: "aqui não é a casa da mãe Joana que a Fifa vem dizer que um estádio desse tamanho, com R$ 250 milhões de reforma que o São Paulo queria fazer, não serve para a abertura da Copa. Acho absurdo.

Por quê?

Porque já estava lá. Quem disse que o Brasil tem que fazer a abertura no estádio mais moderno do mundo? Não precisa. Por que não pode ser no Morumbi? Como economista digo que a solução mais racional seria a abertura no Morumbi, e o Pacaembu ficar por 30 anos com o Corinthians, que bancaria a modernização, faria a restauração do patrimônio histórico dele. Eu só me ferro, se pudesse receber o estádio hoje, prontinho, gerando receita, seriam cinco meses a mais de receita que eu teria. Não tem vantagem nenhuma pro clube ser estádio de abertura de Copa. É só pentelhação e aumento de gasto.

Você se incomoda mais com essa história porque o clube não bateu o pé para não assinar o documento se comprometendo a pagar as estruturas complementares?

Foi imposição da Fifa, e o clube teve que aceitar porque já estava no jogo. Mas é um absurdo o Corinthians pagar pela festa dos patrocinadores da Fifa [áreas de hospitalidade].  No começo de tudo falei, vamos fazer isso como contribuição para São Paulo, mas não quero que o Corinthians seja penalizado por causa disso. Vou fazer meu estádio de R$ 400 milhões faço financiamento, pago juros, não tem problema. Agora o que for adicional eu não pago. O que eu ganho com isso? O que eu ganho em fazer área administrativa, aumentar tamanho de corredor, invadir área dos tubulões da Petrobras? Só perco com isso. Coisa de índio lutar pra ser abertura da Copa, pra ser Copa. Mas passa tudo isso e fica o estádio mas inacreditável do mundo.

A demora para o início das vendas dos camarotes preocupa?

Não. Isso vai vender como pão de queijo e são só cem. Gostaria de já estar vendendo ingresso para ter mais noção dessa previsão de receitas com bilheteria. A grande mudança que a gente precisa fazer é vender o ingresso pra temporada toda. Não precisa ser a vista, mas eu comprometi o cara com a compra e não dependo tanto [do resultado] do futebol, da chuva.

A fama de que o Lula apadrinhou o estádio, mais ajudou ou atrapalhou?

Nem atrapalhou nem ajudou. O que ele fez pelo estádio? Nada. Pergunta pro Andrés. Ele torceu pra ficar pronto. Legal.

Não foi ele que convenceu a Odebrecht a entrar no projeto?

Você acha que precisa convencer o vampiro a tomar sangue? Por que precisa convencer a Odebrecht? Qual o dinheiro que ela está investindo? Qual o favor que ela me fez? Lula é um corintiano fanático, e uma das figuras de mais destaque do país, só isso.

Mas ele sentou para conversar com a Odebrecht.

 Sentou com os caras pra falar o que? O que precisa falar pra ela construir um estádio de um bilhão? Gostaria mais que tivessem dado o estádio para o Corinthians, mas estou com uma conta, se os Cids saírem inteiros,  de pelo menos R$  500 milhões pra pagar. O que me deram? Eu que troquei um estádio certinho, do tamanho que eu precisava pra manter… Deixa eu não me queixar muito, acho que é obrigação do maior time do Brasil fazer isso.  Sou contra tomar a decisão sobre a Copa, mas tomou.  O São Paulo não consegue viabilizar o estádio dele [na Copa], o Corinthians está começando a fazer o seu. Mexe e acomoda o interesse da nação, é a República Popular do Corinthians. Eu te mostrei que o Corinthians botou R$ 120 milhões no estádio da abertura. Os Cids não foram para o Corinthians, são para ampliar a obra para a abertura. E o que os outros colocaram? No Corinthians é tudo assim, com sangue suor e lágrimas.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.