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Queixas de traição e ingratidão. Entenda a crise entre Tite e Mário Gobbi

Perrone

12/10/2014 06h00

Numa reunião entre a comissão técnica do Corinthians e o presidente do clube, em março de 2013, a relação entre Tite e Mário Gobbi começou a desandar. De lá até dezembro, suspeitas de traição e queixas de ingratidão deixaram uma série de cicatrizes nos dois lados. São marcas que começaram a ser mostradas pelo principal dirigente alvinegro nesta semana. Em entrevista ao ao Sportv, ele deu a entender que sofreu uma das maiores decepções de sua vida com Tite, apesar de substituir o nome do treinador por corpo técnico.

No terceiro mês de 2013, o time estava mal. Gobbi resolveu fazer cobranças durante um encontro com a comissão técnica. O presidente enxergava certa soberba na equipe, após a conquista da Libertadores e do Mundial no ano anterior.

Naquele dia, ele reclamou do preparo físico diretamente com o Fábio Mahseredjian, responsável pela área e que foi defendido por Tite. Fábio explicou que a equipe voltaria da parada para a Copa das Confederações na ponta dos cascos. E Gobbi deixou a sala com a impressão de que Tite não engoliu a cobrança.

Cerca de quatro meses depois, aumentou a suspeita de Gobbi sobre Tite estar descontente com ele. Foi antes de uma conversa que o treinador teria com os jogadores no dia da final da Recopa Sul-Americana, contra o São Paulo. O dirigente participaria do encontro e foi até a sala do treinador, que se arrumava sem conversar com o chefe. Gobbi, apesar de não falar em público, acredita que por estar magoado com as cobranças o técnico evitava falar com ele.

O Corinthians ganhou, mas não embalou no Brasileiro, aumentando as diferenças entre cartola e treinador. Gobbi se irritou porque Tite segurou alguns veteranos do elenco campeão mundial, mas não fazia com que eles jogassem em alto nível. O caso principal é o de Emerson Sheik, que renovou contrato em julho daquele ano a pedido do técnico e de diretores do clube.

O presidente queria uma reformulação no elenco e se decepcionou com Tite por entender que ele preferiu fechar com seus campeões a priorizar o rendimento da equipe. Para piorar, alguns desses jogadores (de novo Sheik é exemplo) mantinham amizade com Duílio Monteiro Alves, diretor-adjunto de futebol, com quem Gobbi tinha relação protocolar. Segundo aliados do presidente, Duílio só não havia sido afastado do cargo para não despertar a ira de Andrés Sanchez, unha e carne com o diretor.

Nesse momento, o sentimento de Gobbi era de que Tite não foi tão profissional como sempre pareceu, pois não dispensou alguns de seus pupilos, apesar da queda de produção. Ainda hoje, mesmo sem falar com todas as letras, o dirigente vê uma dose de ingratidão no técnico, por acreditar que ele subiu no salto após as conquistas a ponto de chegar a evitar o presidente e não aceitar cobranças mais fortes.

Mas Tite também deixou o Parque São Jorge com um baú repleto de queixas contra Gobbi. Mantém todas bem trancadas. Não quer polêmica, ainda mais porque está cotado para voltar ao clube em 2015, depois da eleição no Parque São Jorge.

O que mais feriu o ex-treinador alvinegro foi ouvir de gente bem informada no clube que Gobbi acertou a contratação de Mano Menezes antes de sua saída. Entre técnicos, tal atitude é vista como traição imperdoável. O presidente nega, mas um integrante de seu estafe disse ao blog que o acerto verbal com Mano já tinha sido feito antes de o Brasileiro de 2013 terminar.

Segundo pessoas ligadas a Tite, ele acredita que, a fim de pavimentar o caminho de volta para Mano, Gobbi e seus aliados passaram a vazar informações para a imprensa. Uma delas diz respeito à suposta exigência do treinador para que o clube comprasse um modelo de apito que ninguém conseguia encontrar na cidade, numa demonstração de arrogância.

Outra é a história de que Tite afirmou que o clube poderia vender Marquinhos para a Roma, que o revendeu por uma fortuna para o PSG, porque ele não tinha altura para ser zagueiro e não aguentava trombadas com atacantes fortes, tanto que testaria o jogador na lateral. Na versão do treinador, a diretoria inteira concordou com ele, optando pela negociação. Ao Sportv, Gobbi responsabilizou o "corpo técnico" pela saída de Marquinhos a preço de banana. Demonstrando mágoa, disse que o tal corpo técnico saiu do CT para ir à sua sala pedir a venda a fim de obter receita para a contratação de um volante.

Como Gobbi está em fim de mandato, não será surpresa se ele for mais incisivo em relação a Tite da próxima vez em que for indagado sobre assuntos referentes ao ex-técnico. Afinal, presidente de clube quando está de saída costuma ficar com a língua solta.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.