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Investigações instalam intrigas e insegurança entre cartolas brasileiros

Perrone

17/06/2015 10h04

Se o relatório da Justiça americana com acusações de corrupção no futebol mundial parece roteiro de filme sobre mafiosos, no Brasil ele incorporou mais ingredientes cinematográficos. Intrigas, ameaças e conflitos se instalaram entre personagens do cenário boleiro nacional.

Um dos protagonistas, curiosamente, está fora de cena. Mesmo preso na Suíça, acusado de receber propinas, e sem falar com ninguém do meio, José Maria Marin é responsável por boa parte dessa trama. A começar por um fato ocorrido antes de ficar atrás das grades. Quando se preparava para viajar, ele telefonou para Delfim Peixoto e disse que na volta queria se reunir com o colega catarinense, vice-presidente da CBF, porque tinha muito para falar. "Ele não deu detalhes sobre o que falaria", contou Delfim ao blog.

A informação despeja uma pitada de intriga no reino da cartolagem brasileira, já que a interpretação de dirigentes de federações estaduais é de que Marin estava descontente com o tratamento dado a ele por Marco Polo Del Nero desde o amigo assumir seu posto na presidência da CBF. Ora, se Marin acha que o presidente atual virou as costas para ele, não vai se preocupar, se for o caso, em proteger o ex-aliado nos interrogatórios, argumentam os cartolas das entidades estaduais.

Some a isso o fato de a família de Marin, que diz a amigos confiar na inocência dele, desejar que ele conte tudo que sabe. O resultado é uma pressão considerável sobre Del Nero, que nega envolvimento com o esquema de suborno, mas virou alvo de desconfianças porque um dos suspeitos pertence aos primeiros escalões de Fifa, CBF e Conmebol, como ele.

Oficialmente, o presidente da confederação nacional ganhou apoio dos seus colegas de entidades estaduais. Mas, longe de Del Nero, representantes de quatro federações disseram ao blog que se o nome dele aparecer nas investigações exigirão sua saída. Soa como ameaça.

Acuado, Del Nero tenta dissipar conflitos, evita sair do país, mesmo com a seleção brasileira jogando no Chile, e adota uma agenda proativa. Mas, de seu quartel general também partem alguns disparos ou cutucões. Como quando Walter Feldman, secretário-geral da CBF, disse ao blog logo após a prisão de dirigentes na Suíça que o presidente, como ninguém, não pode colocar a mão no fogo por outra pessoa, ao falar sobre Marin. Ou ao afirmar que "precisamos saber melhor o que está acontecendo, o J. Hawilla tem interesses comerciais, perdeu contrato". A segunda declaração supõe que o dono da Traffic Sports tenha carregado em seus depoimentos para os americanos como forma de se vingar de derrotas comerciais.

Hawilla é quem mais construiu esse enredo graças à sua confissão de culpa e à cooperação com a Justiça americana. Entregou nomes e valores de subornos. Espalhou insegurança principalmente por ter aceito usar um grampo do FBI, igualzinho aos do cinema, para conversar com colegas. Ninguém sabe quem caiu na armadilha.

Tudo indica que sua atuação provocou uma ação da Polícia Federal do Brasil, a pedido dos americanos, na sede da Klefer, empresa concorrente da sua Traffic Sports na compra e venda de direitos de transmissão de campeonatos, campo fértil para o suborno no futebol.

Colocado no roteiro provavelmente por Hawilla, Kléber Leite, dono da Klefer, entrou atirando.

"Soube que neste período, J.Hawilla passou por momentos difíceis em função de grave doença. Provavelmente, pelo que ouço e leio, a cabeça dele deve ter sido afetada. A cabeça, o caráter e, principalmente, o sentimento de gratidão. Lamentável! Que fim de vida", escreveu Kléber num comunicado publicado na internet.

Todos são inocentes até que se prove o contrário, mais impossível não lembrar novamente dos filmes de Hollywood em que acusados começam a se atacar para o deleite do FBI. Nesse caso, os tiras reais devem estar esfregando as mãos com tanta discórdia plantada.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.