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Perrone

Carta para a dona Lucia. Aquela que escreveu para Felipão após o 7 a 1

Perrone

08/07/2015 06h00

 

Olá, Dona Lucia. Hoje faz um ano que o Brasil levou de 7 a 1 da Alemanha, e lembrei daquela carta que a senhora mandou pro Felipão depois da derrota. Como a CBF disse que a senhora não queria aparecer, não tenho seu e-mail. Então, escrevi pra senhora aqui no blog, talvez chegue ao seu conhecimento.

Fiquei na dúvida se continuou acompanhando a seleção brasileira, por isso escrevo para atualizar a senhora sobre como estão as coisas depois do 7 a 1. Sabe o que mudou? Quase nada.

Lembro que na sua carta, na verdade e-mail lido resumidamente pelo Carlos Alberto Parreira, a senhora disse: "mais uma vez vi diante da câmera um homem íntegro e corajoso". Falava do Felipão depois do massacre alemão, né?

Sabe o que eu vi depois de outra derrota do Brasil, dessa vez na Copa América, para a Colômbia? Vi diante da câmera um técnico gaúcho reclamando da arbitragem, como na Copa do Mundo. Não, Felipão não continuou na seleção. Mas a CBF chamou pro lugar dele outro gaúcho (nada contra os treinadores do Rio Grande do Sul), Dunga, que nos momentos ruins reclama do juiz como Luiz Felipe Scolari. E que surpreende a imprensa em discurso sobre eliminação como Felipão. Mas, em vez de falar de apagão, Dunga surpreendeu depois da eliminação diante do Paraguai falando de uma virose que atingiu os jogadores antes da partida. Só que ninguém tinha ouvido falar disso antes do jogo. Ou seja, o fracasso no Mundial não serviu nem para o novo treinador perceber que é melhor assumir totalmente as falhas da equipe.

Pois é, dona Lucia, a CBF perdeu a chance de inovar após o 7 a 1 trazendo um treinador estrangeiro ou dando oportunidade a quem é experiente e nunca esteve lá, mas os cartolas mostraram que pouco aprenderam com a humilhação em Belo Horizonte.

Por falar em dirigente, lembra do José Maria Marin, que era presidente da CBF e desfilava escoltado pela Polícia Federal na Copa? Ele foi levado de um hotel por policiais federais dos Estados Unidos, do famoso FBI,  e por tiras suíços, mas dessa vez parou no xilindró. Está faz mais de um mês em cana na Suíça.

Essa foi uma das poucas mudanças no futebol brasileiro desde os 7 a 1, a prisão de um cartola graúdo, mas só aconteceu porque a cavalaria americana chegou. Os gringos juram que mais dois brasileiros estão no rolo. Estavam no alto escalão da Fifa, da CBF e da Conmebol quando teriam recebido propina.

A senhora, que diz que as mulheres entendem de seres humanos, tem ideia de quem possam ser? Eu não sei. Quem pode saber é o Marco Polo Del Nero, que está faz tanto tempo no futebol e conhece todo mundo nesse meio. Lembra dele? Vivia grudado no Marin. Disse que não sabe quem são os suspeitos.

Del Nero agora é presidente da CBF, e eu seria injusto se dissesse que ele não está fazendo nada para mudar o futebol brasileiro depois do 7 a 1. Ele criou um conselho pra discutir mudanças no nosso futebol. Isso quase um ano depois dos 7 a 1. Acredita? A senhora acha que vai dar em alguma coisa? Acho que não. Precisamos de mais ação e menos conversa.

Enquanto eles conversam, grandes clubes brasileiros atrasam salários, trocam treinador como quem muda de gravata (foram nove em oito rodadas do Brasileirão) e desmancham o time no meio do campeonato em busca de grana. Tudo como antes do fiasco histórico.

Pra não dizer que nada mudou desde que a senhora apareceu e sumiu, virou moda os treinadores brasileiros desempregados viajarem para Europa. Vão se reciclar, dizem. Acho é efeito das críticas que o Felipão sofreu. Aquele papo de que ele estaria defasado.

E que boca a senhora tem. Na carta pro Scolari a senhora disse que tudo passaria e ficaria bem. Pra ele ficou. Depois de uma passagem nada empolgante pelo  Grêmio, ele foi trabalhar na China. Belo de um contrato. O time dele até ganhou de sete outro dia.

Mas não ficou bem pra seleção brasileira. Pelo que vi na Copa América, acho que o Brasil nunca correu tanto risco de ficar fora de um Mundial como do próximo.

Bom, como não tenho um Parreira pra fazer um resumo da minha carta, fico por aqui. Veja se dá um sinal de vida, dona Lucia. Um abraço.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.