Topo

Perrone

De diferenciado a 'barraqueiro'. 'Cardeais' tentam explicar mudança do SPFC

Perrone

18/09/2015 06h00

Quantas vezes você viu Juvenal Juvêncio ou outro dirigente do São Paulo encher a boca para dizer que o clube era diferenciado? Provavelmente muitas.

Mas o orgulho de pertencer a uma instituição que resolvia seus problemas internamente, com classe, tem dado lugar ao incômodo de quem vê seus dirigentes lavarem roupa suja em público.

E esta semana foi exemplar para mostrar essa transformação com diversas discussões em público. O que estaria acontecendo com um dos clubes mais pomposos do Brasil? Qual a solução?

Em busca de respostas, o blog ouviu quatro "cardeais" são-paulinos, sendo três deles ex-presidentes e, consequentemente, membros do conselho consultivo.

Leia abaixo as entrevistas.

Fernando Casal De Rey, ex-presidente

Já viu o São Paulo lavar tanta roupa suja em público?

Não é a tradição do São Paulo. A tradição é discutir num nível mais elevado. Infelizmente, nem sempre isso é possível. O importante é que o clube agora tome atitudes para reverter esse processo, fazer algo para equacionar esse problema (financeiro). Parece que algo está sendo feito agora.

Como o clube chegou a esse ponto?

Não é problema de vazar informação. Hoje não se segura mais nada. O problema é sair do nível com o qual o São Paulo está acostumado. Existe uma divergência entre dois presidentes (o atual, Carlos Miguel Aidar, e o antecessor, Juvenal Juvêncio) que ficam trocando farpas em público e que passam dos limites éticos. Mas a instabilidade do país também deixa as instituições mais instáveis. No país, de maneira geral, as pessoas também estão menos tolerantes umas com as outras.

 Qual a solução?

A maneira de colocar as coisas precisa ser revista. É preciso discutir lá dentro no conselho deliberativo. O São Paulo precisa reconstruir sua imagem. O conselho consultivo tem tentado reverter essa situação, mas uma atitude mais efetiva passa pela diretoria executiva. Você não pode obrigar as pessoas a seguirem seus dogmas, mas temos que continuar tentando. Na próxima reunião, isso deve ser colocado, de a linha de conduta ser menos agressiva.

Roberto Natel, ex-vice-presidente

Já viu o São Paulo lavar tanta roupa suja em público?

Nunca vi o São Paulo nessa situação. Vejo com uma tristeza muito grande. Os homes do São Paulo sempre tiveram estrutura, caráter para mostrar o caminho do clube. Hoje não é assim.

Como o clube chegou a esse ponto?

Hoje, com o twitter, não se lava mais roupa internamente. Mas quem começou a jogar as coisas para fora do muro foi o presidente (Aidar). E sou culpado em parte porque coloquei um presidente que não tinha capacidade para ocupar o cargo na atualidade. Hoje, ele (Aidar) não sabe se posicionar, coloca suas vontades em primeiro lugar, não olha o São Paulo, fala o que não deve. Quem começou a falar do São Paulo foi quem tinha que proteger o clube. Ele falou que o estádio é obsoleto, que o clube tem dívidas. Tudo que ele faz é pensado, ele (Juvenal) só respondeu o que o presidente falou. Nada que ele (Aidar) tenha feito foi sem um motivo lá na frente. O presidente é o culpado por isso.

Qual a solução?

É corrigir o erro de colocar quem não tinha capacidade para sentar na cadeira. Todo dia tem escândalo, tem uma coisa que desagrada ao são-paulino. Ele fala uma coisa de manhã, outra à tarde. A missão do são-paulino é fiscalizar para o nosso presidente não acabar com o São Paulo. O São Paulo tem credibilidade, quem não tem são os seus diretores. Como conselheiro, tenho a obrigação de fiscalizar para em 2017 (ano de eleição) acertar o São Paulo. Fiscalizar para que até lá não esteja numa situação que não tenha volta. Por mais que ele (Aidar) não goste, estarei sempre vigiando para ver o que está errado. A partir do momento em que o presidente e o vice olharem para o São Paulo vou dar parabéns.

José Eduardo Mesquita Pimenta, ex-presidente e presidente do Conselho Consultivo

Já viu o São Paulo lavando tanta roupa suja em público?

Sou sócio desde 1952 e estou no conselho deliberativo desde 1966. Nunca vi uma situação semelhante. Perdeu o respeito. O clube respeitava seus valores, não tinha discussão fora do clube. Não me lembro em que ano, mas quando foram à Justiça por terem criado o conselheiro biônico foi um escândalo porque a tradição era resolver internamente. Hoje, o clube está todo desagregado. Nunca assisti ao São Paulo tão conflituoso.

Como o clube chegou a esse ponto?

É a pergunta que também me faço. Aquela reviravolta do Aidar rompendo com o Juvenal (Juvêncio) foi estranha. Aidar deveria saber de tudo aquilo antes de se candidatar. Então, não sei como foi surpreendido depois de eleito. Politicamente não tem grupo dominante como antes. Ficou difícil de administrar.

Qual a solução?

Não sei qual é a saída. Como intervir se a administração é presidencialista? Ele (Aidar) vai dirigindo à moda dele. Abílio (Diniz) surgiu de uma maneira que esperavam que ele colocasse dinheiro no clube. Ele não colocou e virou uma discussão pública, o que é desmoralizante para o clube. Eu não saberia apontar o caminho. Agora teria que ter um governo de coalizão em que as pessoas ajudassem o presidente. Mas o clube é tão heterogêneo que não sei se é possível. O conselho consultivo continua conversando com ele (Aidar), mas sempre somos surpreendidos. Para a minha surpresa, ele falou do Leco (presidente do conselho) de novo. Se não existe uma relação de cumplicidade entre os dois, ela precisa ser cordial.

Isso prejudica a imagem do clube?

Sim. Quem está de fora fica em dúvida, desconfiado (com receio de patrocinar o clube). Já rifaram aquela imagem do São Paulo (de clube diferenciado). Não tiveram o cuidado de preservar o São Paulo. Quando o próprio presidente não se preocupa em ser o guardião desses valores, não sei se desanda tudo, ele tem que dar o exemplo. Aidar sempre foi muito habilidoso, agora não está sendo. Os valores do clube precisam ser passados com a postura do presidente. Pode ser que nem saibam mais que o São Paulo é diferente.

 José Augusto Bastos Neto, ex-presidente

Já viu o São Paulo lavando tanta roupa suja em público?

Conheço o São Paulo faz mais de 50 anos. Teve uma época em que mandavam o Manoel Raimundo e o Laudo Natel. Não tinha briga. Mas era outro nível de pessoa. Não era assim.

Como chegou a esse ponto?

Os presidentes sempre tiveram problemas, oposição. Mas a mídia era diferente. Antigamente não tinha twitter. Hoje o cara não precisa nem saber falar português. Ele aperta o botão e fala o que quer. Não sei se é verdade ou mentira. Um fica achincalhando o outro. O Juvenal saiu, veio o Carlos Miguel e quem não foi agraciado ficou contra, atacando. O maior problema é a internet que dá facilidade para isso. E hoje o nível das pessoas, de um modo geral, no país, é inferior em relação à antigamente.

Qual a solução?

O conselho consultivo não tem interferência nisso, quem tem é o conselho deliberativo. O que sei é que a diretoria e o conselho não podem brigar um com o outro (como está acontecendo entre o presidente do clube e o do conselho).

Isso prejudica a imagem do clube?

Incomoda. Fui comprar fruta e o cara veio falar que o clube não era assim.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.