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As diferenças entre Havelange e Laor

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16/08/2016 12h18

Nesta terça morreram João Havelange e Luis Álvaro de Oliveira Ribeiro, o Laor. Entrevistei pouco o ex-presidente da Fifa, mas muito o ex-mandatário do Santos.

João era de respostas curtas e grossas, exalava mau humor em seus contatos com a imprensa. Luís era capaz levar dez minutos respondendo a uma questão com seu jeito bonachão. Não me lembro de uma só entrevista com ele na qual não tenha ouvido histórias sobre Pelé. Quase sempre atendia ao telefone. Já Havelange era blindado por uma secretária. Certa vez, ela me fez enviar um fax com pedido de entrevista. Semanas depois, recebi pelo correio uma carta com uma educada explicação de que o ex-cartolão da Fifa não falaria.

Laor gostava de falar de como convenceu Neymar a renovar contrato com o Santos. Dizia que seduziu o atacante até com a promessa de arrumar um modelo de passeio da Ferrari emprestado para o jovem em início de carreira pilotar em Interlagos. Rasgava o verbo quando estava irritado com alguém, como fez ao me responder sobre seu relacionamento com Neymar pai.

Havelange foi mais discreto quando arranquei algumas palavras dele durante a Copa da Alemanha, em 2006, e estava incomodado com presidente do Brasil. "Pergunte ao senhor Lula", disse ele rangendo os dentes sobre se o Mundial de 2014 seria em solo brasileiro.

João pode ser considerado um dos fundadores de um estilo de administrar futebol que sobrevive até hoje, com cartolas que se perpetuam no poder graças aos benefícios dados aos que os elegem, não são transparentes e fazem fortuna.

Laor assumiu a presidência do Santos prometendo ser diferente. Pregou a gestão profissional, se apresentou como o mais promissor protótipo do cartola moderno, mas não promoveu a revolução alardeada. Seu modelo de gerir o clube baseado num comitê de gestão emperrou por conta da demora na tomada de decisões e das divergências entre seus membros. Em maio de 2014, enfrentando uma oposição que queria afastar o presidente, Laor renunciou à presidência do Santos por problemas de saúde. Como parte de seu legado, deixou a polêmica transferência de Neymar, fonte inesgotável de ações na Justiça e investigações. Morreu sem ver como vai terminar essa história. Assim como Havelange partiu sem assistir ao fim do desbotado estilo de cartolagem que é a cara dele. Um jeito que agoniza, mas sobrevive e tem em Marco Polo Del Nero seu principal expoente no Brasil.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.