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De bares à TV Globo. Tudo na arena passa por escritório de amigo de Andrés

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24/12/2016 06h00

Primeira página do contrato entre Corinthians e Caixa com a marca do escritório da família Molina

Primeira página do contrato entre Corinthians e Caixa com a marca do escritório da família Molina

A ordem é expressa da direção corintiana: nenhum contrato relativo à arena do clube pode ser fechado sem antes ser analisado pelo escritório de advocacia Molina & Reis, da família de Paulo Molina, amigo de infância de Andrés Sanchez, ex-presidente alvinegro.

Exploração do telão da arena pela Globo, manutenção do estádio pela Tejofran, segurança feita pela Power, do grupo Tejofran, concessão das lanchonetes para a empresa AR Fast Food do Brasil, acompanhamento da auditoria que determinará se a Odebrecht cumpriu o contrato com o clube, participação na estruturação do fundo que compraria os naming rights da casa corintiana e até a renovação mais recente do contrato de patrocínio com a Caixa. Esses são só alguns exemplos dos contratos nos quais o escritório de confiança do deputado federal Andrés Sanchez trabalhou.

A concentração de poder veio acompanhada de críticas e polêmicas. Conselheiros e funcionários do clube questionam os motivos que levaram um escritório terceirizado a centralizar os assuntos da arena e a cuidar de ao menos um tema ligado a outras áreas (o patrocínio da Caixa) se o clube tem sua diretoria jurídica. Rogério Mollica, ex-diretor jurídico alvinegro, pediu demissão recentemente e colocou internamente a influência do Molina e Reis entre os motivos para seu afastamento. Há ainda o questionamento de não ter havido concorrência para a escolha do escritório.

Paulo Molina, que é bacharel em direito, atuando como consultor, e seus advogados também são criticados por supostas orientações que teriam sido prejudiciais ao clube.

Por sua vez, o escritório se defende afirmando que impediu várias negociações na arena que seriam lesivas ao Corinthians e se orgulha, entre outras ações, de sua participação na renovação com a Caixa. O contrato é considerado por Paulo o melhor do banco estatal com um clube brasileiro. Já o diretor financeiro, Emerson Piovezan, costuma elogiar acordo para fornecimento de energia elétrica na arena que o Molina & Reis também se considera o principal responsável.

Remuneração

Em maio, Andrés disse em entrevista à Folha de S.Paulo que Molina respondia tecnicamente à diretoria sobre assuntos relativos à arena de graça por ser corintiano e que seria remunerado se um dia assinasse contrato. Esse dia já chegou. O escritório da família de Paulo recebe para acompanhar a auditoria na arena. Também faz contratos referentes aos demais temas que analisa.

Na esteira desses trabalhos, detratores de Molina afirmam que sua atuação no Corinthians o fez trocar um escritório em casa por uma sede que, segundo o site da empresa, fica em bairro nobre de São Paulo.

Paulo responde alegando que antes tinha um home office por opção e que também atuava no escritório de um parente. Alega que o novo local em que trabalha nada tem a ver com os serviços prestados ao Corinthians.

Camarote

Outra polêmica que envolve o amigo de Andrés é o uso gratuito por ele e seus parentes advogados de um camarote na arena. A queixa de pessoas envolvidas com o clube e o estádio é de que o Corinthians conseguiu alugar poucos desses espaços, assim não poderia se dar ao luxo de permitir o uso sem cobrança.

"Não ganhamos camarote na arena. Foi cedido com a concordância dos envolvidos o direito de uso ao escritório pelo trabalho que desenvolvemos. Quando estamos lá (no camarote) mais trabalhamos do que assistimos aos jogos. Verificamos como está o funcionamento das coisas e levamos pessoas interessadas em adquirir camarotes", disse Molinha ao blog.

Conflito

Um suposto conflito de interesses que envolveria Molina é negado por ele. O caso tem a ver com a Tejofran, empresa contratada para atuar na manutenção da arena.

O blog teve acesso à troca de e-mails em que Paulo e seu filho Guilherme se colocam diante do fundo que administra o estádio como responsáveis por recolher, documentos, assinatura e dialogar com a Tejofran. Numa das mensagens, em 2014, Molina cita que o advogado do clube para o assunto (contratos com a Tejofran) é Ivandro Sanchez, cujo escritório não trabalha mais para o Corinthians.

 Em outro e-mail sobre contratos com a mesma empresa, ainda em 2014, Guilherme diz ao fundo que já solicitou o reconhecimento da firma da assinatura do senhor Telmo. No mesmo ano, Telmo Giolito Porto, assinou pela Empresa Tejofran de Saneamentos e Serviços contrato com o Corinthians.  As correspondências deixam margem para se questionar se o Molina & Reis trabalhava para a Tejofran.

Hoje a manutenção da arena, sob a batuta da Tejofran, faz parte das divergências entre Corinthians e Odebrecht. Apoiado em parecer do escritório, o clube aponta a Odebrecht como responsável por falhas na manutenção. A construtora, no entanto, afirma que esse serviço não é responsabilidade dela. O conflito estaria no fato de Molina supostamente trabalhar ao mesmo tempo para o clube e uma empresa que também deve ter seu trabalho analisado pela auditoria coordenada pelo escritório dele.

Só que o Molina & Reis nega que tenha atuado para a Tejofran. Afirma que conversar com a empresa e recolher documentos junto à ela faz parte de seu trabalho. E usa como argumentação o fato de em uma divergência entre a empresa e o clube ter solucionado a questão de maneira favorável ao Corinthians.

O blog não conseguiu falar com representantes da Tejofran.

Protetor

O escritório Molina & Reis considera que seu trabalho tem sido fundamental para evitar contratos prejudiciais ao Corinthians. Entre eles estaria o de uma empresa que queria ganhar porcentagem nas vendas de camarotes até nos casos em que a comercialização não fosse feita por ela.

 Na relação também está a negociação do pedido de uma nova carência para o pagamento do financiamento de R$ 400 milhões junto ao BNDES, por intermédio da Caixa, para pagar a construção do estádio. Na ocasião, o escritório defendeu que no material enviado ao banco federal ficasse registrado que atrasos na obra impediram a geração de receita esperada na arena.

"É natural que quando o escritório começa a pontuar coisas que possam prejudicar o projeto (da arena) e orientar (o clube) de forma mais profunda e detalhada você incomode quem estava acostumado a fazer coisas com menos exigência", declarou Molina.

Amigos

Molina costuma dizer para o ex-presidente corintiano que é o melhor amigo dele na história. Eram íntimos aos 14 anos. Depois de adultos, ficaram décadas sem se ver. Acabaram se reencontrando por acaso, e em seguida Paulo foi convidado por Andrés para analisar o primeiro contrato de concessão de lanchonetes da arena.

Apesar da amizade, o bacharel não gosta quando é citado como amigo de Andrés por achar o termo pejorativo, desvalorizando seu trabalho.

Crise

Em novembro, o Molina & Reis viveu um momento de crise com Roberto de Andrade, presidente corintiano. O escritório não foi consultado sobre o fato de a Odebrecht retomar obra que tinha sido interrompida na arena após sua orientação.

Andrés chegou a se manifestar contrário à decisão de Andrade.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.