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Falta de fôlego e motim. Os receios que Drogba gera no Corinthians

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14/01/2017 04h00

"Ele é muito carismático. Mas terá o pique de um Zé Roberto (veterano do Palmeiras)? Pro marketing é uma boa, mas pode ser uma 'drogba' para o futebol". A afirmação, com direito a trocadilho, feita ao blog por Luis Paulo Rosenberg, idealizador do projeto que levou Ronaldo ao Corinthians, resume as dúvidas e receios gerados no Parque São Jorge pela operação montada para contratar Drogba.

As questões centrais são relativas ao que o marfinense de 38 anos pode render em campo e o receio de que jogadores que tem sofrido com atrasos nos direitos de imagem se rebelem por conta da chegada de um companheiro que vai ganhar entre R$ 400 e R$ 500 mil por mês, conforme o blog apurou, se o negócio der certo.  A diretoria nāo confirma o valor.

A dúvida técnica é tão forte que ainda nesta sexta-feira o empresário André Campoy, ex-conselheiro do clube e que está entre os que  tocam a negociação, esperava aval dos responsáveis técnicos pelo time (Fábio Carille e Alessandro), e do diretor de futebol, Flávio Adauto, ao presidente Roberto de Andrade para dar prosseguimento à negociação, o que aconteceu à tarde.

O trio ainda estudava Drogba para dar seu parecer final, segundo Campoy. Por sua vez, o agente usa números do atacante na última temporada no principal campeonato norte-americano (23 gols em 41 jogos) e referências de outros jogadores para justificar o projeto. "Willian e David Luiz (que jogaram com Drogba no Chelsea) falaram muito bem dele", afirmou Campoy. Pelos relatos colhidos, além das qualidades em campo, Drogba é considerado "bom de grupo".

Os maiores questionamentos em relação ao atacante são em relação a se ele aguentará o ritmo das partidas. Entre seus defensores há a tese de que mesmo entrando no segundo tempo ele seria uma arma importante, além de alavancar o marketing corintiano.

Críticos da diretoria, porém, apontam que falta na direção alguém que atue preventivamente para impedir um motim no vestiário com a chegada do estrangeiro com salário alto após atrasos nos direitos de imagem na última temporada.

"Os jogadores podem perguntar por que a diretoria não conseguiu parceiros no marketing antes para evitar os atrasos? Falta alguém com comando para chamar os jogadores e dizer: 'vou trazer esse cara aqui para conseguir mais dinheiro para o clube e melhorar a folha salarial'. Se não souberem lidar com o vestiário, os jogadores podem falar: 'vamos deixar esse cara correr sozinho", disse o conselheiro Romeu Tuma Júnior, crítico da direção. "A diretoria não tem autoridade para angariar seguidores para o projeto. Como ela vai justificar um investimento duvidoso para o próprio clube, incluindo conselheiros, sócios, torcedores e jogadores, sendo que a finança está numa situação de penúria", completou Tuma Júnior.

Assim como o conselheiro, Campoy defende um papo com os atletas para evitar rebeldia. "A chegada dele pode alavancar dinheiro por meio do marketing para o clube parar de atrasar direitos de imagem. Isso tem que ser mostrado para os jogadores", argumentou o empresário.

Contradição

A tentativa de trazer um atleta para ganhar entre R$ 400 e R$ 500 mil mensais soa como uma contradição no atual momento vivido pelo Corinthians. O clube enfrenta um duro processo de cortes de gastos e até agora defendia a montagem de um elenco modesto, valorizando os garotos da base. O valor da atual folha de pagamento do time tem sido alvo de críticas até de aliados de Andrade.

Procurado pelo blog, Emerson Piovezan, diretor financeiro corintiano, afirmou apenas que foi consultado sobre a possível contratação, sem detalhar valores e justificar a operação

Dirigente que pediu para nāo ter seu nome citado disse, após a publicação do post, que a quantia combinada como salário é inferior a R$ 400 mil mensais.

Além dos atrasos nos direitos de imagem, o alvinegro renegocia a extensão do prazo para o pagamento da dívida com a Caixa pelo financiamento junto ao BNDS para pagar a construção de sua arena e precisou tirar dinheiro do futebol para quitar pequena parte do débito.

Quem defende a contratação, lembra que há salários semelhantes no elenco. É o caso de Cristian, que recebe cerca de R$ 420 mil por mês.

Marketing

Também participa da operação Drogba, Gustavo Herbetta, ex-gerente de marketing do clube e que pediu demissão recentemente. Ele foi autorizado a viajar para Londres e tentar sacramentar o acerto com Drogba. Herbetta assegura ter empresas interessadas em explorar a imagem do marfinense, mas sem arcar diretamente com o salário dele.

Esse ponto gera críticas de dissidentes da atual diretoria. Lembram que aconteceram casos recentes de patrocinadores obtidos pelo departamento de marketing que tiveram dificuldades para honrar seus compromissos e afirmam ser prova de desorganização um ex-funcionário comandar empreitada de tamanha importância.

Desviando o foco?

Opositores e dissidentes do grupo Renovação e Transparência afirmam que a tentativa de trazer Drogba é mais uma estratégia para desviar o foco dos problemas da administração do que um esforço para reforçar o time.

A análise é de que Andrade tenta um novo caso Ronaldo para se reerguer no clube em meio a um pedido de impeachment e intermináveis problemas com a arena corintiana. A contratação do Fenômeno foi o momento de consolidação do Renovação e Transparência.

A iniciativa também é vista como uma tentativa do presidente de mostrar que pode se virar sem a ajuda de Andrés Sanchez, que não está na linha de frente da operação. Nesta semana, Andrade recusou sugestões do ex-presidente para mudar sua diretoria e se fortalecer contra o impeachment.

Otimismo

Enquanto o Parque São Jorge ferve, a diretoria está otimista. Espera sacramentar a contratação até o próximo domingo.

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.