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Quase ausência de fãs brasileiros negros e pardos na Rússia constrange

Perrone

11/07/2018 10h55

Foi muito bonita a festa da torcida brasileira na Copa da Rússia. Músicas novas, batucada e animação. Mas um olhar atento revela algo constrangedor: as quase ausências de negros e pardos. Era assim sempre que havia uma aglomeração de brasileiros. Quase todos eram brancos. Muitas vezes todos eram. Nos estádios, a maior parte das exceções fazia parte das famílias dos atletas.

Em Kazan, um dia antes da derrota para a Bélgica, este blogueiro demorou cerca de 10 minutos para encontrar um negro na torcida que fazia festa para os jogadores na chegada ao hotel. No grupo de 23 atletas que retribuía protocolarmente à calorosa recepção aparentemente havia mais negros do que nas centenas de torcedores.

A quase totalidade de brasileiros brancos em Mundiais fora do país não é novidade. Mas indica nossa incapacidade de diminuir o abismo social e econômico que faz o Brasil sangrar. Já vivemos copas do Mundo com nossa economia forte, fraca e mais ou menos. Sempre fomos representados quase só por brancos. Mas parar, olhar e pensar diante de uma multidão de turistas praticamente sem negros e pardos nos constrange e preocupa como cidadãos. Ou pelo menos deveria causar sentimentos que nos façam refletir sobre isso.

A presença quase que totalitária de brancos não reflete a cara do país. Segundo dados disponíveis no site do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa), em 2017 a maioria dos brasileiros declarava se considerar parda. Foram 96.946.000 moradores de diferentes regiões do país se dizendo pardos, e 90.379.000 afirmando serem brancos. Outros 17.835.000 se identificaram com a cor preta (é assim que está na pesquisa, cor preta, não raça negra).

O fato de os brancos terem mais condições de fazer uma viagem cara como essa não é culpa de quem teve dinheiro para realizar um sonho e seguir a seleção em território russo. Esse cara não merece ser demonizado, rotulado de coxinha ou levar na cara outras expressões preconceituosas. A culpa é do país como um todo, que cotidianamente dá de ombros para a desigualdade social dramática instalada em nossas cidades. O mais triste é que não há como vislumbrar mudança nesse cenário nem a longo prazo.

 

Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.