Como o São Paulo virou campo minado para seu presidente
Perrone
23/02/2016 06h00
Como quem pisa num campo minado, Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, vai hoje ao Morumbi para participar da reunião em que o Conselho Deliberativo do São Paulo irá decidir se referenda acordo da diretoria para renovar contrato com a Globo.
Costuras políticas para que pudesse chegar ao poder e heranças deixadas por Carlos Miguel Aidar provocam essa dificuldade para o cartola se movimentar no clube que preside.
Não só na reunião desta noite, mas, diariamente, Leco precisa estudar cada passo para evitar explosões.
Protagonista na reunião desta terça, Ataide Gil Guerreiro, vice-presidente de futebol é personagem fundamental para que se entenda como em apenas quatro meses de gestão Leco enfrenta tantas dificuldades.
Sem a ajuda de Ataide, dificilmente Aidar teria renunciado, pois a gravação feita por ele e na qual o ex-presidente sugeria dividir comissão na compra de um jogador da Portuguesa foi o golpe fatal no ex-cartola.
Leco é grato pela atitude do vice de futebol. Esse foi um dos motivos que o levaram a empossar Ataíde em sua diretoria. Foi como colocar a primeira mina no Morumbi.
Ataíde sofre rejeição por parte de vários grupos políticos. Eles avaliam que o vice demorou para contar o que sabia de Aidar, classificam como ruim sua gestão no futebol e entendem que por ter agredido o ex-presidente deveria ser punido e ficar fora da direção.
A diretoria teme que essa turma vote contra a proposta de renovação com a Globo para transmissão de jogos do Brasileirão nas TVs aberta e fechada a partir de 2019 só para prejudicar o desafeto. Foi ele quem negociou o contrato e fará a exposição dele aos conselheiros.
Leco disse aos atletas que a renovação com a Globo garante que não haverá mais atrasos nos pagamentos até dezembro. Entrarão imediatamente R$ 60 milhões nos cofres como luvas.
Porém, na reunião desta noite, só o contrato com a Globo poderá ser aprovado. A proposta do Esporte Interativo (EI) pelos direitos em TV fechada será apresentada num quadro, mas não estará em análise. Se o conselho rejeitar a Globo, uma nova reunião precisará ser marcada, caso a diretoria, então, se entenda com o EI. Essa demora deixaria o clube com risco de voltar a atrasar os pagamentos dos jogadores e traria problemas para Ataíde.
Outro efeito colateral da chegada ao poder de Leco também poderá ser sentido na reunião. Ele tem nome e sobrenome: Abilio Diniz. Apesar de não ser conselheiro, o empresário e consultor do Conselho Consultivo tricolor foi convidado pelo presidente do Conselho Deliberativo para falar aos conselheiros.
Abilio ajudou a derrubar Aidar, também usando o salão do conselho como palco. Seus ataques foram importantes para deixar o ex-presidente nas cordas.
Desde então, o empresário acreditava ser um estimado conselheiro de Leco. Mas se revoltou ao ver Milton Cruz, indicado por ele para ser técnico do time, ser afastado da comissão técnica para trabalhar com análise de desempenho no clube. Também não gostou de outro indicado seu, Alexandre Bourgeois, ser demitido do cargo de CEO. E ficou descontente ao saber pelos jornais da contratação de Edgardo Bauza. O empresário esperava ser consultado.
Diniz só terá o conselho como palanque hoje graças a uma herança da gestão passada. Leco era presidente do conselho, então, foi substituído por seu vice, Marcelo Abranches Pupo Barboza, integrante de um dos grupos que apoiaram a eleição de Aidar. Foi dele a iniciativa de convidar Abilio para a reunião.
"Convidei o Abilio em janeiro, antes dessa troca de e-mails (mensagens que o empresário e Leco enviaram para conselheiros trocando disparos). Fiz um convite para ele dar uma mensagem ao conselho e também por gratidão pela ajuda que ele tem dado ao clube", disse Pupo ao blog.
A diretoria diz não se queixar do fato de Abilio ter sido chamado, mas reclama de Pupo ter indicado Roberto Opice Blum para presidir o comitê de ética do clube. Os dirigentes afirmam que ele é distante de Leco e desafeto de Ataíde. Entre outros temas, o grupo dirigido por Blum investiga a agressão de Ataide a Aidar no ano passado.
"Isso é bobeira. Opice é uma pessoa seríssima e está trabalhando com neutralidade. Foi uma das melhores indicações que eu fiz para as comissões", afirmou Pupo.
Diferentemente de Blum e do presidente do conselho, uma série de cartolas ganhou cargos de direção sem fazer parte do grupo político de Leco, mas por participarem da costura que o ajudou a chegar à presidência.
Desde a semana passada, o mais conhecido deles é Rodrigo Gaspar, assessor do presidente que em rede social criticou Michel Bastos, Rodrigo Caio e Milton Cruz. Ele integra uma ala de jovens conselheiros que bombardeou Aidar e é conhecida como "kamikazes".
Tem sido frequente no clube diretores que pertencem a correntes políticas diferentes da do presidente serem pressionados por seus parceiros que discordam de parte das atitudes de Leco ou dos homens de confiança dele. Cada divergência espalha mais pólvora ao redor do principal cartola são-paulino..
Sobre o Autor
Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.
Sobre o Blog
Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.