E-mails apontam suposta fraude na construção da Arena Corinthians
Perrone
19/10/2016 10h19
Em setembro de 2015, o arquiteto responsável pelo projeto da Arena Corinthians, Anibal Coutinho, alertou o clube para a existência de um suposto processo fraudulento relacionado ao estádio.
Num e-mail enviado por ele em 10 de setembro de 2015 ao presidente alvinegro, Roberto de Andrade, e ao qual o blog teve acesso, o arquiteto afirma que o fundo que administra o estádio aceitou relatórios da Odebrecht que atestavam a conclusão da obra em setembro de 2014, um ano antes de ela ser considerada concluída pela própria construtora. Na mesma correspondência, ele aponta que todas as notas fiscais relacionadas ao trabalho da Odebrecht até 2015 foram emitidas ainda em 2014. Ou seja, antes de parte do serviço ser executada, o que é irregular. Anibal ainda declarou que em setembro de 2015 a Odebrecht considerava a obra praticamente pronta, mas que faltavam ser executadas partes do projeto arquitetônico avaliadas em mais de R$ 85 milhões. No ano passado, o "Blog do Paulinho" publicou boletim de avanço de agosto de 2014 mostrando que não havia mais o que ser executado na obra.
A Odebrecht é a principal controladora do fundo, mas o clube também participa dele.
Por meio da assessoria de imprensa do Corinthians, Andrade respondeu ao blog que a direção corintiana "está tomando providências junto aos responsáveis pela gestão da arena" sobre a informação passada há mais de um ano pelo arquiteto de que foram aceitos os boletins que atestavam o fim da obra antes de ele de fato acontecer e de que notas fiscais também foram emitidas antes da conclusão dos serviços. A respeito da informação de que deixaram de ser executados trechos do projeto arquitetônico avaliados em R$ 85 milhões a resposta foi de que o clube "contratou uma auditoria para analisar o projeto e verificar o que foi executado e o que deixou de ser executado, bem como o valor do que não foi executado".
Já a assessoria de imprensa da Odebrecht afirmou que a empresa não se manifestaria sobre os e-mails. Coutinho disse que não poderia comentar o conteúdo de mensagens confidenciais. Mário Gobbi, presidente do Corinthians na ocasião em que as notas fiscais e os boletins de avanço teriam sido emitidos, não foi localizado pelo blog. Rodrigo Cavalcante, diretor da BRL Trust, empresa que cuida do fundo responsável pela arena, não atendeu ao blog.
A mensagem enviada por Anibal a Andrade, com cópia para Andrés Sanchez, ex-presidente corintiano e ex-superindente do estádio, foi escrita após publicação pela "Folha de S.Paulo" de reportagem sobre relatório em que o arquiteto apontava problemas na execução da obra. A publicação também trazia nota da Odebrecht afirmando que a arena estava quase pronta e que todas as etapas da obra foram estabelecidas de comum acordo com o Corinthians. Como sócio do escritório contratado pelo clube para acompanhar a obra, o arquiteto mandou a mensagem pedindo esclarecimentos ao presidente corintiano, pois não havia sido informado de mudanças no contrato que pudessem diminuir a quantidade de serviços a serem realizados.
"Em flagrante desrespeito ao contrato e, no meu entendimento, tornando tais boletins (de avanço) nulos, não há paginas do diário de obras desde novembro de 2013, e centenas de páginas de ocorrências antes desta data, como também não há nenhum destes documentos referentes ao ano de 2015, assinados ou não", escreveu Anibal detalhando supostas irregularidades na condução da obra.
Em outro trecho, ele diz que a construtora afirmou para a "Folha de S.Paulo", em setembro de 2013, que eram poucos os pontos a serem concluídos na obra, mas que se verifica "a ausência de dezenas de itens, montando a mais de R$ 85 milhões estas lacunas, além de vários itens a refazer, cuja a execução não atinge padrões de aceitação".
Na carta, o arquiteto também diz que se sentiu desautorizado pela construtora, que afirmou na nota para a "Folha de S.Paulo" que seu único cliente é o Corinthians, ignorando o fato de seu escritório ter sido contratado para cuidar da obra.
Seis dias depois, o presidente do Corinthians respondeu por e-mail ao arquiteto confirmando a legitimidade da empresa dele para acompanhar a obra e afirmando que nenhuma mudança contratual havia sido feita sem o conhecimento de Anibal. No entanto, ao ser indagado pelo blog se o clube concordou com mudanças que teriam diminuído o valor do projeto em R$ 85 milhões, Andrade respondeu, por meio da assessoria de imprensa do clube que "trata-se de informação comercial resguardada por cláusula de confidencialidade".
Abaixo, veja e-mail em que Aníbal Coutinho avisa o Corinthians sobre a suposta fraude.
Sobre o Autor
Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.
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