Como Ronaldinho convenceu Justiça e optou por prisão em hotel
Perrone
08/04/2020 04h00
Na quarta-feira da semana passada, a defesa de Ronaldinho Gaúcho e Assis já sabia que a perícia nos celulares dos irmãos, feita a pedido do Ministério Público paraguaio, não havia encontrado dados incriminadores. Com essa informação, começou o trabalho para transformar a prisão preventiva de ambos em domiciliar. O plano foi concluído com sucesso nesta terça (7). Depois de 32 dias presos preventivamente na "Agrupación Especializada de la Policia Nacional", em Assunção, eles foram autorizados a ficar em prisão domiciliar num hotel enquanto durar o processo.
Nesta quarta, os advogados dos brasileiros devem se reunir para traçar nova estratégia com o objetivo de colocar a dupla em liberdade.
Os defensores dos ex-jogadores confiavam que conseguiriam convencer o Ministério Público e a Justiça a aceitar a prisão domiciliar se o exame nos aparelhos telefônicos não apontasse indícios de outros crimes, além de porte e uso de documentos paraguaios com conteúdo falso.
Quando recusaram dois pedidos semelhantes, promotores e a Justiça alegaram que era preciso averiguar se os brasileiros tinham alguma outra ligação com demais envolvidos no caso.
O principal objetivo era saber qual o vínculo dos irmãos com Dalia López, empresária foragida da Justiça paraguaia. Ronaldinho participaria de evento da ONG comandada por ela. López pediu para dois intermediários providenciarem cédulas de identificação e passaportes paraguaios para os brasileiros. Entre outras questões, a empresária é suspeita de prática de lavagem de dinheiro. Seus advogados negam que ela tenha cometido crimes.
"Nós sabíamos que nada seria encontrado no celulares porque não existe mais nada além dos documentos", afirmou ao blog Sérgio Queiroz, advogado brasileiro de Ronaldinho e Assis.
Com a informação de que o MP não havia encontrado outros vínculos entre os brasileiros e López, Queiroz e os defensores paraguaios decidiram pedir novamente a troca da prisão preventiva pela domiciliar. Esse era um dos poucos pedidos que poderiam fazer durante a quarentena no Paraguai para tentar evitar o avanço do novo coronavírus. Apenas solicitações consideradas urgentes podem ser feitas à Justiça local neste momento.
O primeiro passo foi pensar na fiança a ser oferecida. Precisava ser um valor substancial a ponto de Ministério Público e Justiça entenderem que Ronaldinho e Assis não fugiriam, deixando a quantia para trás.
No primeiro pedido de prisão domiciliar, a garantia seria um imóvel emprestado avaliado em pouco menos de US$ 800 mil. Promotores e juízes consideraram o valor baixo perto do poder aquisitivo dos irmãos.
Na segunda tentativa, foi recusada proposta de fiança de US$ 1,6 milhão via depósito judicial. As autoridades bateram na tecla de que precisavam ampliar as investigações, principalmente fazendo perícia nos celulares dos ex-jogadores.
Com a informação de que os peritos não tinham nada contra Ronaldinho e Assis, os advogados decidiram manter a oferta de US$ 1,6 milhão.
O trabalho, então, foi providenciar a transferência da quantia para uma conta judicial no Banco Nacional de Fomento do Paraguai.
Outra etapa foi encontrar um local para oferecer como moradia dos irmãos para a Justiça. Na primeira tentativa rejeitada pelas autoridades, foi apresentada uma luxuosa casa cedida por um empresário paraguaio. Na segunda oportunidade, os advogados ofereceram como opção um apartamento a ser alugado. Na ocasião alegaram que o imóvel menor seria mais fácil de ser vigiado.
Desta vez, no entanto, escolheram um hotel por causa das rigorosas medidas de restrição de locomoção em Assunção por conta da pandemia de Covid-19.
O entendimento foi de que a logística seria mais fácil no hotel. Em um imóvel residencial, o stafe dos brasileiros avaliou que teria dificuldade para transitar pela capital paraguaia com o objetivo de comprar mantimentos e material de limpeza, além de enfrentar obstáculos para encontrar funcionários.
No hotel, os irmãos passam a ter tudo isso à mão. Foi escolhido um local no qual pelo menos um dos advogados já tinha se hospedado e considerava confortável. O hotel Palmaroga aceitou receber os brasileiros e assinou termo para ser apresentado à Justiça.
Com tudo pronto, os advogados fizeram o pedido pela prisão domiciliar nesta terça pela manhã. No final da tarde já tinham conseguido a resposta positiva do MP e da Justiça.
Ronaldinho e Assis não poderão sair do hotel, mas terão trânsito livre nas dependências do estabelecimento, segundo Queiroz. O local conta com piscina e sala de ginástica. Ainda segundo o advogado brasileiro dos irmãos, só poderá haver guardas do lado de fora do hotel. Eles não podem receber visitas que não sejam de seus advogados. Isso já acontecia no quartel adaptado para ser também prisão no qual eles estavam.
"Foi restabelecida uma parte da Justiça. A outra será restabelecida quando eles forem colocados em liberdade", afirmou Queiroz ao blog. A defesa dos irmãos alega uma série de irregularidades no processo que culminou com a prisão preventiva de ambos e ainda aguarda a análise de duas apelações pedindo a anulação de decisões que resultaram na detenção de seus clientes.
O Ministério Público nega existirem falhas e aponta que ainda há investigações a serem feitas.
"Aceitamos o pedido da defesa, por um lado, por causa do avanço investigativo. Por outro lado, por que os processados ofereceram uma quantia que entendemos garantir que eles se submeterão à prisão domiciliar", afirmou Osmar Legal, um dos promotores responsáveis pelo caso.
Sobre o Autor
Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.
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