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Ação da Globo reforça queixas sobre falta de debate antes de 'MP do Fla'

Perrone

25/06/2020 04h00

Com seu pedido de liminar para tentar impedir que o Flamengo transmita ou  negocie a transmissão de jogos como mandante no Campeonato Carioca, a Globo engrossa o coro de parte dos dirigentes de clubes e de parlamentares. Eles afirmam ter faltado ao presidente Jair Bolsonaro ouvir outros interessados no assunto antes de publicar a Medida Provisória 984.

Os argumentos da emissora na ação na Justiça coincidem com a tese de cartolas e congressistas de que o presidente da República agiu para atender à vontade do rubro-negro e, ao mesmo tempo, alfinetar o grupo de comunicação, que tem como desafeto. Esse sentimento fez a medida ficar conhecida no Congresso Nacional como "MP do Flamengo".

"Conforme declarado à imprensa pelas partes envolvidas, a MP foi editada para atender a um pedido específico do Clube de Regatas do Flamengo, que pretende, com a polêmica retomada do Campeonato Carioca, poder transmitir e televisionar seus próprios jogos", escreveram os advogados da Globo no pedido de liminar.

Antes da Medida Provisória, um jogo só poderia ser televisionado com a concordância das duas equipes envolvidas. Nesse cenário, a maior rede de televisão do país, que comprou os direitos do Estadual do Rio, não poderia exibir os jogos do rubro-negro na competição, pois não entrou em acordo com ele. Por outro lado, o clube da Gávea também não poderia negociar separadamente suas partidas.

Agora, a emissora alega que a MP não pode ter valor retroativo afetando contratos assinados antes dela. Por isso pede que o Flamengo já não possa exibir seus jogos ou negociá-los enquanto a ação se desenrola. A Medida Provisória ainda precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional, mas está em vigor até que isso aconteça.

Como mostrou o "Blog do Rodrigo Mattos", no pedido de liminar, os advogados da Globo deixam explicito o entendimento de que faltou debate, o que coincide com o pensamento de cartolas como Sérgio Sette Câmara, presidente do Atlético-MG.

"Note-se bem: a discussão sobre a melhor forma de alocar os direitos de transmissão de um evento esportivo é legítima e precisa ser feita. O que não se pode admitir em ordenamentos jurídicos sérios é que isso se dê numa canetada para beneficiar aliados, sem qualquer debate sobre o tema", escreveram os representantes da rede de TV na ação.

No último domingo, 21, o principal dirigente do Galo havia se queixado da falta de diálogo antes de a Medida Provisória ser assinada.

"Foi um voo solo do Landim. Acho que a forma como foi feita pegou todo mundo de surpresa, e isso incomodou os presidentes", havia dito Sette Câmara.

Na ação, a Globo anexou entrevistas de cartolas criticando a falta de debate, como esse trecho atribuído a Mário Bittencourt, presidente do Fluminense: "o que nos preocupa inicialmente na publicação dessa Medida Provisória é ela ter sido feita num momento de pandemia quando tem tantos outros assuntos mais
emergenciais no país. Em segundo lugar, ter sido elaborada sem uma discussão ampla e profunda com os
maiores interessados, que são os clubes de futebol. Não houve um grande debate, não houve o esgotamento do tema.
Um tema que pode trazer muitos impactos econômicos e comerciais aos clubes".

Também pela ausência de debate congressistas falam em modificações na MP, como mostrou o blog.

No pedido de liminar, a Globo diz que, incomodado com a situação atual, o Flamengo buscou ajuda de Bolsonaro para mudar a antiga regra relativa aos direitos de transmissão.

"Conforme amplamente noticiado
por inúmeros veículos de imprensa e relatado, em primeira pessoa,
pelo presidente do Flamengo em entrevista ao vivo para a TV Band,
em almoço com o presidente da República no último dia 17,
o Flamengo expôs a sua insatisfação e solicitou a mudança da regra que o impedia de dispor dos direitos de transmissão de uma partida sem a anuência da equipe contrária, no que foi prontamente atendido com a edição da MP", escreveram os advogados da Globo na ação.

Eles também reproduziram no pedido de liminar trecho de entrevista televisiva dada por Rodolfo Landim, presidente do Flamengo para a Band.

Na conversa, de acordo com a reprodução feita pelos advogados da Globo, Landim diz o seguinte:

"Como vocês sabem o Flamengo, diferente dos demais clubes, não assinou o contrato de cessão dos direitos de transmissão com a rede de televisão que detém de todos os outros. Por causa disso, os jogos do Flamengo não vinham sendo transmitidos. Quando nós tivemos o problema de público, nós entramos em contato com eles para poder abrir para o público. Nós negociamos fazer isso com a abertura da mídia digital. […] A gente ficou conversando com o presidente ontem, teve essa posse do Ministro de Comunicações. Ele convidou a mim, ao Felipe Melo e ao próprio Ministro. Nós estávamos conversando e o presidente perguntou: 'Vai voltar mesmo o futebol no Rio? E o televisionamento?' Eu expliquei para ele em detalhes que a gente tem um problema na legislação que diz o seguinte: os dois clubes precisam aprovar para que um jogo possa ser passado. […] Dito isto, eu expliquei isso para o presidente, falei como ocorre em vários outros países, diversas outras ligas, onde o mandante tem direito sobre seus jogos. […] O Presidente entendeu isso,  disse que ia agir rapidamente, e eu recebi a notícia aqui de que ele acabou de publicar no Diário Oficial uma medida dizendo que o direito de imagem do clube é do mandante do jogo".

Após reproduzirem as palavras do presidente flamenguista, os representantes da emissora concluem que "assim, sem que o tema tenha sido tratado com os demais clubes do país, com as federações de futebol, com veículos de mídia,
potenciais cessionários dos direitos, atletas e sindicatos ou
quaisquer das outras diversas entidades e pessoas impactadas direta
e indiretamente, mudou-se a norma que regia os Direitos de Arena
consagrada na Lei Pelé e em legislações anteriores desde 1973".

Por sua vez, Landim chegou a dar e entrevista afirmando que a MP é boa para todos os clubes. A direção rubro-negra mantém o entendimento de que, enquanto o Congresso Nacional decide se aprova ou não a MP, a agremiação tem o direito de exibir ou negociar seus jogos como mandante.

Nesta quarta (24), o site do Flamengo publicou declaração do vice-presidente de relações externas, Luiz Eduardo Baptista, o Bap, exaltando a Medida Provisória.

"Entendemos que a MP para gente é uma carta de alforria, uma lei áurea. No estatuto do torcedor, o mandante tem que cumprir com suas responsabilidades e obrigações. A MP assinada é um sopro de esperança, e tomara que seja aprovada no Congresso Nacional. Essa é a nossa opinião", disse o cartola.

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Sobre o Autor

Ricardo Perrone é formado em jornalismo pela PUC-SP, em 1991, cobriu como enviado quatro Copas do Mundo, entre 2006 e 2018. Iniciou a carreira nas redações dos jornais Gazeta de Pinheiros e A Gazeta Esportiva, além de atuar como repórter esportivo da Rádio ABC, de Santo André. De 1993 a 1997, foi repórter da Folha Ribeirão, de onde saiu para trabalhar na editoria de esporte do jornal Notícias Populares. Em 2000, transferiu-se para a Folha de S.Paulo. Foi repórter da editoria de esporte e editor da coluna Painel FC. Entre maio de 2009 e agosto de 2010 foi um dos editores da Revista Placar.

Sobre o Blog

Prioriza a informação que está longe do alcance das câmeras e microfones. Busca antecipar discussões e decisões tomadas por dirigentes, empresários, jogadores e políticos envolvidos com o futebol brasileiro.


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